Rio em vez de máquina de lavar
No lavadouro da freguesia dos pescadores ouve-se “A Afurada é linda!”
As protagonistas são as lavadeiras da Afurada, de Vila Nova de Gaia, que pela manhã vendem peixe e à tarde lavam no rio. Estão deliciadas com o lavadouro renovado e os turistas tiram fotografias sem pedir licença.
Todas as tardes, Aurora Moreira, peixeira de profissão, aprendeu sob o olhar da mãe, desde pequena, a lavar à mão. "Gosto mais de vir ao rio do que usar a máquina. A gente aqui distrai-se. Falamos umas para as outras, uma diz uma imposturice, outra diz outra, e convivemos todas juntas. É muito bom vir para o rio lavar".
O perfume a sabão azul encanta por quem lá passa, assim como, a água fria que têm tanto de agradável como de eficiente. "Lavar no rio é fora de série. Fica a roupa muito melhor, nem minga nem nada. Aqui a roupa fica sempre bonita", conta Aurora.
No coração do Centro Histórico do Porto também se lava à mão. O lavadouro da Sé tem muitos tanques pequenos, alinhados e cada um com a sua torneira. "Antigamente não havia pias para toda a gente. Andavam ao barulho. Era bicha para acabarem umas e virem outras. Agora não, agora é mais calmo, já vem uma, vai embora, e depois já é capaz de ficar vazio. Mesmo assim acho giro porque ainda o procuram", descreve Antónia Bessa, a porteira do tanque da Sé.
Antónia é quem tem a chave do lavadouro. Abre o portão vermelho para quem queira lavar ali. Mas não há muita gente. Usam-no "mais na época de verão, quando se refrescam as roupas". Quem dá valor são os estrangeiros. "Dão muito valor a isto, se calhar até mais do que nós aqui. Até ao domingo e à segunda, que eu estou em casa, vejo. Eles vêm e metem as máquinas por dentro das grades para tirar fotografias. Lá está, eles adoram isto", conta.
"Eu já tive aqui homens estrangeiros a lavar a roupa. Sentaram-se aqui, dormiram com as roupas estendidas a secar e depois meteram-nas na maleta para levar embora. Acaba por ser uma coisa mesmo útil, quer para nós quer para os estrangeiros", esclareceu.
Rosa Dias esfregou 40 anos a roupa dos outros, agora só lava a dela. Às 6h00 estava a sair da Maia para ir ao Porto buscar roupa. Já no Porto, ia a Cedofeita, ia buscar roupa suja às "freguesas". Trazia "seis algibeiras de roupa para lavar". "Elas pagavam-me muito bem. Metia o dinheiro na algibeira e vinha toda contente para casa. Vinha a contar o dinheiro e quando tinha muitas notas de 50 e 100 escudos trazia um rodo de dinheiro para casa. Uma trouxa podia render naquela altura cerca de dois contos. Era assim a minha vida", recorda Rosa Dias. A ex-lavadeira, que ficou com a mesma profissão da mãe quando casou aos 22 anos, ainda hoje lava à mão. "Ainda sei lavar, ainda torço a roupa bem torcida. Quando fui para a minha casa nova, os meus filhos queriam comprar uma máquina de lavar, mas eu disse que enquanto tiver forças é ao rio que vou lavar", menciona com dignidade.
Hoje em dia ninguém quer aprender a lavar a roupa à mão, é só meter na máquina e, como dizem os franceses, voilá.