Fale com a robô
Muitas empresas põem os clientes a falar com máquinas na Internet: são mais baratas, rápidas e disponíveis. Mas é fácil a conversa resvalar para piadas, comentários impróprios e insultos.
A Anna estreou-se na secção de apoio ao cliente do IKEA em 2005: apesar das dificuldades em perceber várias perguntas dos clientes, e de lhe chamarem “burra”, a paciência era o seu ponto forte. “Por favor, faça perguntas sobre a loja e não se zangue comigo”, repetia. Independentemente do que diziam, nunca perdeu a calma até ser dispensada em 2015. A tecnologia, diz a empresa, estava desactualizada.
Foi criada para reduzir custos no departamento do apoio ao cliente. A Anna devia responder a perguntas simples sobre os produtos e serviços do IKEA, feitas por quem navegava no site. Metade das mensagens, porém, eram complexas, agressivas ou tinham pouco a ver com os produtos da empresa.
"Entre 30% e 50% tornavam-se impróprias, mal-educadas ou sobre sexo,” recorda ao PÚBLICO Magnus Jern, o director de inovação da DMI, a empresa que trabalhou no desenvolvimento da versão móvel daquele chatbot. “Quando as pessoas percebem que estão a falar com um robô que não as consegue perceber a 100%, partem frequentemente para uma linguagem incorrecta. Isto torna-se um problema quando o chatbot redirecciona o contacto para um assistente humano porque não está a perceber o que está a ser dito.” Foi uma das razões que contribuíram para que a Anna fosse retirada do site.
“Somos uma empresa de pessoas, para pessoas. Utilizar o nome foi uma forma de tentarmos humanizar o mais possível um sistema virtual que, em 2005, não era ainda muito conhecido”, explica Claudia Domingues, a actual directora de sustentabilidade do IKEA Portugal. Com os anos, perceberam que o programa “não era suficientemente eficaz para responder às perguntas feitas”, que eram cada vez mais específicas e diversificadas. O nome, personalidade e expressão humana do serviço de respostas automáticas levavam os clientes a terem expectativas irrealistas sobre o tipo de respostas que a Anna poderia dar.
Regra geral, o “cérebro” destes programas é composto por frases pré-definidas, que funcionam como um guião. A resposta certa é escolhida com base em palavras-chave e expressões detectadas nas perguntas dos utilizadores. Idealmente, estes programas estão disponíveis 24 horas por dia, para que os assistentes humanos se dediquem, exclusivamente, a questões mais complexas. Muitas vezes, porém, basta que uma das palavras seja diferente das que estão no guião para que o programa fique confuso. Por exemplo, um sinónimo ou um erro ortográfico.
“Há muito potencial no serviço, mas até 90% das empresas que tentam desenvolver este tipo de tecnologia falham”, diz Magnus Jern. “Ainda é muito difícil trocar um assistente humano por um robô, a não ser que se invista tempo suficiente no seu desenvolvimento, a testá-lo em conjunto com assistentes humanos.”
Apesar dos números, cada vez mais empresas aceitam o desafio: em 2016, o mercado estava avaliado em 703,3 milhões de dólares e prevê-se que continue a crescer 35% ao ano até 2021, segundo a empresa de análise Markets & Markets.
No caso da Coca-Cola, a introdução do “agente virtual” Chip, em 2014, criado para gerir o site de prémios da marca, terá permitido poupar entre cinco a dez dólares por cada chamada telefónica ou email feito por um trabalhador real.
Fonte: "Público"